ENTREVISTA: OSVALDO BERTOLINO

BLOG DA DILMA: O escritor Alexandru Solomon, defensor da candidatura tucana para 2010, disse que faltou à oposição(PSDB/DEM/PPS), nesses anos uma postura digna de suas ambições. Seguramente “deixar sangrar Lula”, no ápice da crise do “inexistente” mensalão não passou de fracassada esperteza. O que você acha dessa e de outras manifestações da Mídia Golpista contra o presidente Lula?
Osvaldo Bertolino -
Bem, o “mensalão” — sempre entre aspas — foi uma das maiores farsas políticas da história do Brasil. Todas as acusações se basearam, sem revelar a fonte, no esquema de captação de recursos para campanhas eleitorais por meio de “caixa dois” criado pelos corruptos que dominaram a “era FHC”. Há indícios de que o esquema demo-tucano funcionava desde 1992.

A direita tentou reviver o clima golpista dos anos que precederam o golpe militar de 1964. Essa gente à toa da mídia golpista, corrupta e vagabunda chegou ao limite das torpezas para tentar golpear o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O vigor democrático da esquerda e a habilidade política do presidente para puxar o centro para o lado do governo — se o centro houvesse pendido para a direita, creio que as dificuldades seriam maiores — isolaram os demos-tucanos e sua mídia torpe. Mas acho que devemos manter os olhos bem abertos.


Parece haver nas ações da direita brasileira de hoje cada vez mais coisas entre o céu, onde está a imaginação, e a terra, onde se vive a realidade, do que sonha a nossa vã filosofia. Pelas melhores regras do que se considera ser a ciência política, pela sabedoria acumulada nas academias e até pelas experiências do passado, tais e tais causas deveriam gerar tais e tais efeitos; desta ou daquela situação teria de resultar esta ou aquela conseqüência.


Mas não tem sido assim. Isso se deve a mais interessante inovação que a direita trouxe para o debate político: o Departamento de Gerência de Falsidades e Mentiras. Ou seja: a mídia. Essa anomalia da civilização vem tentando sistematicamente relançar o espetáculo circense do “mensalão”. Lembremos que o próprio FHC — uma espécie de monumento às maiores torpezas e vilanias da história brasileira — entrou em cena para “lamentar” a demora do Supremo Tribunal Federal (STF) em apreciar o caso. Ao jornal Folha de S. Paulo, o tucano defendeu o julgamento de todos os 40 “acusados” pela Procuradoria Geral da República.


FHC é uma dessas figuras que a gente ouve porque não é surdo. Ele disse outras bobagens, como as
“recaídas chavistas” do presidente Lula, mas dor-de-cotovelo é um assunto que não convém comentar. O fato é que o “mensalão” ficou velho cedo e novos atos precisavam — e precisam — ser encenados. O “caso Renan”, o “caso dos cartões corporativos”, o “caso da CPI da Petrobrás” e o “caso Sarney” são alguns exemplos desse script ignóbil. O circo não pode parar.

O “messalão”, examinado de perto, mostra que, como na parábola do camelo da Bíblia, não leva nenhum dos acusadores a entrar no reino dos céus — ou, até, em lugares onde o ingresso exige méritos muito mais modestos. O bicho teria menos trabalho para passar pelo buraco de uma agulha do que um desses acusadores para ser abrigado na morada dos justos.


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: As críticas políticas do Globo às vezes parecem saídas da boca de um estudante radical. E o Estadão, Zero Hora, Folha de São Paulo, A Tarde, Diário de Pernambuco, Veja, Época e IstoÉ?
Osvaldo Bertolino -
Olha, a mídia brasileira, repito, é um entrave ao processo civilizatório. Cláudio Abramo, conceituado jornalista com idéias situadas à esquerda no espectro político e respeitável ícone do jornalismo brasileiro, dizia que a ideologia dos donos de jornais é a mesma das classes dominantes. Para ele, que conheceu as entranhas de jornais como Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo, os grandes meios de comunicação são, ao mesmo tempo, negócios empresariais e emissores ideológicos do poder elitista.

Abramo também sentenciou, com conhecimento de causa, que é impossível existir democracia em um país em que a TV é explorada por grupos privados. Segundo ele, para ter democracia no Brasil é preciso começar fechando todas as TVs particulares. Esses latifúndios de mídia, dizia ele, são as primeiras trincheiras usadas pelas classes dominantes em casos de crises políticas ou trocas de comando no poder central. À difusão desbragada do lugar-comum, do vulgar, da violência e de idéias obscurantistas, somam-se as falsificações da realidade, as injúrias e difamações sobre tudo o que é ou parece progressista.


Cumpre essa função, além dos conceitos ocos e vulgares, o curral de opiniões domesticadas do jornalismo brasileiro. Essa mentalidade de "cordão sanitário" no plano das idéias criou um ambiente profissional ditatorial, em que qualquer alternativa ao modo elitista de se produzir notícias é respondida com a discriminação e o boicote.


Nos anos 80, em várias redações e assessorias de imprensa brasileiras havia um pôster com a imagem de Cláudio Abramo, com sua frase: "O jornalismo é o exercício diário da inteligência e a prática cotidiana do caráter". O mundo do jornalismo agora é outro. Inácio Ramonet, do Le Monde Diplomatique, chamou a atenção para uma evidência ao afirmar que nunca a humanidade esteve tão desinformada como hoje, apesar do torrencial fluxo de informação disponível. É que para esse modelo de mídia, as idéias progressistas podem até existir, mas elas têm de permanecer afônicas.


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: Caso Cesare Battisti, o que tem de mentira e de verdade?
Osvaldo Bertolino -
Creio que este caso é mais um da série “que venha 2010!”. Óbvio que a mídia torpe vem tratando o assunto com sua habitual sordidez para tentar atingir o governo Lula. Mas é preciso ver também o lado jurídico da questão — que tem interface direita com a luta política. Dalmo Dallari, um jurista de quem gosto muito, recentemente escreveu um artigo esclarecedor sobre o assunto no Jornal do Brasil. No Estado democrático de direito, como é o Brasil, disse ele, a Constituição é o conjunto normativo superior, que rege todos os atos jurídicos que forem praticados por qualquer autoridade ou qualquer órgão público brasileiro.

Isso tem aplicação tanto para atos que sejam praticados e produzam efeitos no âmbito nacional, quanto os atos de qualquer natureza praticados num foro internacional ou para produzirem efeitos além das fronteiras nacionais, esclareceu o jurista. A Constituição brasileira é superior aos acordos e tratados que forem celebrados por qualquer membro do governo brasileiro, pois nenhuma autoridade pode celebrar validamente um acordo ou assinar um tratado que seja contrário a alguma disposição da Constituição brasileira.


Dallari lembra que é oportuno lembrar e ressaltar a superioridade da Constituição brasileira, neste momento em que membros do governo italiano e alguns brasileiros a eles submissos pretendem que ao decidir sobre o pedido de extradição do italiano Cesare Battisti o tratado de extradição assinado pelos governos do Brasil e da Itália prevaleça sobre a Constituição brasileira.


Essa tentativa da direita de fazer prevalecer a vontade do governo italiano sobre a vontade do povo brasileiro, consagrada na Constituição, já foi externada e repelida várias vezes e agora tomou novo alento porque o ministro Eros Grau, dando maior precisão ao voto proferido no julgamento do pedido de extradição de Battisti, esclareceu o que quis dizer quando falou em decisão discricionária do presidente.


Externando o que, para as pessoas bem informadas e de boa-fé, era óbvio, disse agora o eminente ministro que jamais teve a intenção de afirmar que o presidente da República poderá decidir arbitrariamente, mas deverá fundar-se na Constituição. Assim, pois, o ministro Eros Grau não modificou o seu voto, mas apenas explicitou o óbvio: na decisão sobre o pedido de extradição, que é de sua competência privativa, como diz a Constituição e foi reafirmado pelo Supremo Tribunal Federal, o presidente da República deverá ter em conta o que determina a Constituição brasileira.


O exame de todos os elementos jurídicos envolvidos nas circunstâncias de fato e nos processos judiciais relativos ao caso Battisti e ao pedido de sua extradição leva necessariamente à conclusão de que o pedido de extradição não poderá ser atendido pelo governo brasileiro, devendo, portanto, ser recusado pelo presidente da República, pela existência de claros obstáculos constitucionais ao atendimento do pedido. Creio que as explicações de Dallari são suficientemente claras para jogar por terra toda a argumentação da direita tanto política quanto jurídica.


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: O governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda (DEM), montou em seu escritório político uma espécie de balcão de financiamento de campanhas em 2006. Dali, abasteceu 220 candidaturas à Câmara Legislativa do Distrito Federal, hoje alvo do escândalo, e 16 à Câmara dos Deputados, num total de R$ 642 mil. O nome de José Arruda era o nome preferido de José Serra para compor sua chapa presidencial para 2010? Por que Serra e a Mídia Golpista tentam negar o convite e não falar do Escândalo do Panetone Distrital?
Osvaldo Bertolino -
A direita, obviamente, tenta marchar unida para 2010. E este caso de Brasília espalha areia para todos os lados. Ninguém da turma demo-tucana sairá incólume desse episódio. Então, para eles o melhor a fazer é jogar a sujeira embaixo do tapete. Creio o caso oferece uma boa oportunidade para debatermos a necessidade de uma reforma política que institua o financiamento público para as campanhas e outras medidas verdadeiramente democratizantes. Esse debate está posto e segue um bom caminho. Obvio que terá pelo frente o poderoso obstáculo da direita e a defesa do seu poder econômico. Eles fogem da democracia como o Diabo da água benta.

Creio que o episódio oferece também a oportunidade de debatermos o conceito de corrupção. Eis uma das mais desafiadoras esfinges brasileiras — quebra-cabeças que impõe sua lógica rarefeita e que não oferece respostas fáceis.


É preciso definir o conceito de corrupção. Parece certo pensá-la, em poucas palavras, como a compra e venda de favores ilícitos. Qualquer pessoa que rompa com a lógica da sua função para favorecer determinado interesse em detrimento de outros, visando alguma forma de benefício, pode ser considerada um corrupto. E a pessoa, física ou jurídica, que comprar tais favores pode ser considerada corruptora. Ou seja: para haver corrupção é preciso que o ambiente em que ela ocorre considere a venda de favores como coisa aceitável.


O furo da bala no que toca a essa questão está entre a herança elitista brasileira e o seu contraponto — a luta por um país democrático e socialmente justo. No período mais recente, quando a democracia irrompeu com força graças sobretudo ao papel histórico da esquerda, a impressão que ficou foi a de que o Brasil institucional expurgou de seu âmago infestado de corrupção algumas crises de dimensões catastróficas e abafou outras igualmente explosivas.


Depois de Collor de Mello, tivemos, entre outras, a crise das pastas azul e rosa, os grampos da Polícia Federal, o caso Sivam, o escândalo das privatizações e a vergonhosa operação que reelegeu FHC à Presidência da República. As ações da esquerda que denunciaram esses fatos escabrosos levaram a maioria da sociedade a não aquiescer em relação às práticas de negociar vantagens, de levar a cabo escambos suspeitos, de traficar interesses obscuros.


Por isso, ao assumir o poder, a esquerda, em aliança com outras forças, elegeu também a retidão e a lei como parte estrutural do seu projeto de governo. Na margem oposta, evidentemente, a tendência foi a de a minoria canalha da sociedade ser cada vez mais hostilizada, isolada que ficou pelo êxito do projeto de país fundado na democracia, na justiça e na ética. Esse desenho no tabuleiro político brasileiro atual é cristalino. Para quem sempre usurpou os recursos públicos essa situação é o pior dos mundos.


Historicamente, pode-se dizer que o poder autoritário em nosso país fez com que a sociedade se mantivesse distante de mecanismos de combate a esse crime. No período democrático recente, foram enviados para Brasília, por meio das urnas, traficantes de drogas, estelionatários e lavadores de dinheiro. Mas também elegemos em bom número representantes probos, que atuam em estreito vínculo com os movimentos sociais e a população.


Como a elite brasileira sempre achou que locupletar-se faz parte do seu rol de direitos, o choque foi inevitável. O Brasil se dividiu e assistiu a um cerrado combate. A vitória eleitoral do bloco que apóia Lula em 2002 representou, teoricamente, uma derrota dessa filosofia direitista. Se uma sociedade verticalizada, com uma enorme distância entre seus principais extratos sociais, é propícia à corrupção, por conseguinte interessa às forças progressistas ações que fiscalizem o Estado por meio dos movimentos sociais e populares.


Essa é uma tarefa que não pode ser delegada, em hipótese alguma, aos inimigos do projeto de Estado que está no poder — como a mídia imunda. É bastante possível que uma dose maior de combatividade na defesa dos interesses nacionais e populares seja precisamente o que falta para que se promova no Brasil, com mais velocidade, a ressurreição do desenvolvimento econômico e a busca do progresso social.


O Estado é fundamental para esse projeto, antítese do sistema de poder que governou o Brasil de 1964 a 2002. Mas uma mudança desse quilate só acontecerá quando a imensa maioria da sociedade decidir que o modelo que serviu à elite com galhardia está esgotado. Um movimento assim, genuinamente popular, de amadurecimento político do povo, é a única maneira de as rupturas progressistas acontecerem. O combate efetivo à corrupção insere-se aí.


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: O governador de São Paulo, José Serra (PSDB) acredita que o povo brasileiro deve ter mais cuidado ao votar para evitar que apareçam novos escândalos de corrupção no país. Serra tenta esquecer o passado tucano? Você engole mais essa do governador Zé Pedágio?
Osvaldo Bertolino -
Penso que José Serra é uma personalidade que precisa ser melhor analisada pelo campo progressista. Ele é astuto e ardiloso. Basta revisitar sua origem política no Estado de São Paulo para ver seu estilo de fazer política. Serra começou a pavimentar seu caminho dando cotoveladas em seus próprios pares. Ele não engoliu as circunstâncias que levaram o trêfego FHC à Presidência da República cavalgando a “estabilidade” do Plano Real dada a ele de mão beijada pela direita internacional.

Serra se julgava mais capacitado do que FHC — o que não é uma tarefa difícil — e procurou demarcar seu espaço. Já em 1994, no auge da histeria neoliberal, ele liderou a montagem de uma arapuca em São Paulo. No dia 29 de dezembro daquele ano, o governador paulista, o tucano Mário Covas, recebeu a visita do então presidente do BC, Pérsio Arida, com uma carta pela qual o Estado pedia a intervenção no Banespa — a mesma que havia sido aceita, pouco antes, pelo então governador carioca, o também tucano Marcelo Alencar, e que resultou na intervenção no Banerj.


Covas recusou a trama e exigiu de Arida uma justificativa para a proposta da equipe econômica. A resposta nunca veio e o imbróglio acabou com a demissão de Arida. Mas a intervenção aconteceu e o Banespa acabou em mãos privadas. Ao longo do processo, holofotes poderosos varreram o caso e revelaram a essência de como a "era FHC" administrou a economia do país. O editor da revista CartaCapital Carlos Drummond reconstituiu o caso com a minudência de um arqueólogo.


Os protagonistas da trama eram tucanos paulistas


A reportagem, baseada em depoimentos e documentos fartamente reproduzidos, é uma minuciosa descrição da reunião de 7 de agosto de 1995, na sede do BC em São Paulo, quando foi apresentado o relatório da comissão de inquérito que durante sete meses apurou "irregularidades" no banco. Com nomes, locais, datas e diálogos, a revista divulgou que naquele dia a comissão anunciou duas decisões: denunciar algumas irregularidades ao Ministério Público e arquivar o inquérito.


Mas o diretor do BC Alkimar Moura, presente à reunião, aceitou uma sugestão: avermelhar falsamente o balanço do Banespa. O artifício foi considerar toda a dívida do governo paulista com o banco como crédito em liquidação. Segundo a apuração de Drummond, o BC praticou uma repreensível "manobra contábil": no dia da intervenção, o Banespa tinha um patrimônio líquido positivo de R$ 1,7 bilhão e a dívida do Estado, no total de R$ 9,4 bilhões, estava em dia, com a exceção de "uma pequena parcela de R$ 25 milhões vencida".


Num truque de fazer Mandrake parecer aprendiz, um saldo de patrimônio líquido positivo de R$ 1,7 bilhão foi transformado em patrimônio líquido negativo de R$ 4,2 bilhões. Os principais protagonistas da trama eram basicamente tucanos paulistas, que começaram a se organizar numa espécie de confraria ainda no governo estadual de Franco Montoro, eleito em 1982 pelo PMDB.


Na ocasião, Orestes Quércia já era o principal líder do PMDB no Estado e aceitou, em nome da unidade, ser vice de Montoro. FHC foi eleito senador pela sublegenda, de carona. Mário Covas foi nomeado prefeito de São Paulo e José Serra assumiu como o poderoso secretário de Planejamento. Sérgio Motta — ministro das Comunicações no governo FHC —, assumiu a presidência da Eletropaulo. Paulo Renato e Bresser Pereira ficaram com o controle das finanças.


Na sucessão de Montoro, o empresário Antônio Ermírio de Moraes, pelo PTB, era um dos concorrentes de Quércia ao cargo de governador e não lançou candidatos ao Senado. Covas e FHC eram os candidatos a senadores pelo PMDB. A deputada peemedebista Ruth Escobar — que mais tarde virou tucana de carteirinha e num banquete chamou Lula de "aquele mecânico" — criou um grande comitê Ermírio, Covas e FHC. Em seguida, pipocaram comitês semelhantes pelo Estado. Foi a senha para a criação do PSDB.


Em 1995, a revista VIP publicou uma reportagem com relatos surpreendentes. Em 1990, quando Covas ficou fora do segundo turno, disputado entre Luiz Antônio Fleury e Paulo Maluf, houve uma revoada de tucanos para a candidatura do PMDB. José Serra foi um dos primeiros a apoiar Fleury. Com a vitória de Fleury, Antônio Cláudio Sochaczewski, o Socha, veio de uma das diretorias do BC para assumir a presidência do Banespa e Wladimir Rioli, que havia sido diretor do banco na gestão Montoro, assumiu a vice-presidência de finanças — de onde saiu, misteriosamente, em 1993.


Como integrante da Comissão de Privatização da Cosipa (Companhia Siderúrgica Paulista), Rioli havia sido acusado pelo Tribunal de Contas da União (TCU) de desviar 14,1 milhões de dólares. Tudo isso sob as vistas de José Serra. A imagem dele subindo a rampa do Palácio do Planalto causa arrepios. E o Brasil tem motivos para temer essa possibilidade.


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: Por que o PSDB tenta se blindar e isolar o escândalo do Mensalão Mineiro, envolvendo o senador Eduardo Azeredo?
Osvaldo Bertolino -
Eis um caso em que se aplica a grande frase de Eça de Queiroz: ou é má-fé cínica ou obtusidade córnea. Há, evidentemente, um ardil. No entanto, como diz o povo, a semeadura é livre, mas a colheita é certa. Para mim, não existe “mensalão mineiro” ou “mensalão de Brasília”. E muito menos “mensalão petista”. O que existe é a tecnologia de “caixa-dois”, genuinamente tucana. O resto é papo-furado. Nas eleições do ano que vem, esse assunto certamente será o mais ventilado. Ele deve ser situado entre os dois pólos que disputam a condução do país desde a Revolução de 1930.

Não se deve acreditar que existe um vácuo na disputa presidencial deste ano deixado pela indefinição da candidatura do PSDB. O nome conta, evidentemente, mas o que vai determiná-lo é a plataforma política da direita. Não passa de conversa mole essa historinha que circulou no noticiário nos últimos dias segundo a qual o PSDB se esfarela numa disputa interna interminável e isso abre campo para o DEM lançar candidato próprio — uma "terceira via".


A pergunta que emerge é a seguinte: há espaço para "terceiras vias", à esquerda ou à direita? A resposta é não. A cantilena da "terceira via" constrói duas hipóteses. Na primeira, o que a mídia diz sobre o quadro partidário brasileiro é balela de campanha para o eleitor incauto engolir.


Combate à desconstrução nacional


Sua tese é a de que, se o crescimento do PT e do PSDB se deve ao fato de esses dois partidos terem capitaneado o moderno desenvolvimento político brasileiro, um terceiro partido que conseguisse subir alguns degraus na escala partidária poderia desalojar um dos dois de seu posto. Aos fatos: para o PSDB, o DEM é a sustentação programática de um importante setor da elite brasileira. Para o DEM, o PSDB é a melhor alavanca para a sua volta ao poder — condição que vinha conseguindo manter já há décadas.


Não importa ao PSDB a imagem que o DEM carrega de ser um partido ligado às oligarquias mais atrasadas do país, ideologicamente melífluo e um retrato fiel do fisiologismo e do clientelismo na política brasileira. Para ambos, o importante é vencer Lula. Para o PT, a lógica política preconiza uma ampla aliança de forças para isolar e derrotar o inimigo principal.


Na segunda hipótese, todos os partidos sonham com o poder para abraçar a missão de gerar progresso e azular o imenso déficit social reinante no país. Outra balela eleitoreira. Não se deve ignorar que a vitória de Lula em 2002 representou a negação do neoliberalismo radical do PSDB e do liberalismo de feição feudal do DEM.


Lula é de longe o melhor presidente que o Brasil teve desde o fim da ditadura militar. José Sarney, apesar de ter conduzido bem o país pela senda democrática, ficava com o rosto marcado por erupções toda vez que seu governo passava por um momento mais difícil. O desvairado Collor dispensa comentários. Itamar Franco foi emparedado já no início do seu governo e FHC reinou absoluto com seu cesarismo atormentado.


Não tínhamos um presidente que aparente tamanha sobriedade diante dos problemas como Lula desde os tempos de Juscelino, Brasília e a bossa nova. Se esse fato singelo fosse admitido pela direita, o debate pelo menos ganharia em transparência. Mas não é. Fala-se em "questões éticas". Não seria "ético" colocar para debate as mudanças em vigor agora. Por quê? O que existe de "antiético" em oferecer aos eleitores, o quanto antes, a chance de conhecer o que vem sendo feito pelo país depois do furacão golpista dos últimos tempos? Haja balela!


A direita fala também de "tradições republicanas". Ora, a mais notável "tradição republicana" dessa gente é o quartel. A não ser que se julgue que a maioria dos brasileiros é idiota, parece claro que o mitológico "hegemonismo da máquina" pelos partidos da base aliada — segundo a direita um risco para a "democracia", pois levaria o Brasil para um sistema de "partido único" — não passa de hipocrisia.


Pois bem. Até que ponto a "máquina" tem o poder de eleger alguém? A "máquina" elegeria Dilma Roussef? Se a resposta for sim, então deveria ter conduzido José Serra à Presidência da República em 2002. Ou até mesmo o ascensorista do Palácio do Planalto. Porque o poder estaria na "máquina", não no que representa o candidato. Pode-se — claro, claro — ser contra Dilma (e eventualmente manifestar essa oposição nas urnas). Só não se pode ser ingênuo a ponto de acreditar nas graves questões de "princípio" erguidas pela direita. O que ela não quer é enfrentar este debate às claras.


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: O que representa para o Brasil o PRÉ-SAL?
Osvaldo Bertolino -
Cada perfuração em águas profundas na Bacia de Campos fornece novos indícios de que ali existe uma outra Nigéria, talvez com reservas de 60 bilhões de barris, talvez com muito mais. E quem é do ramo sabe que a marcha da Petrobras rumo a leste é rica em óleo e gás. O pré-sal precisa ser entendido, acima de tudo, como um potencial de soberania para o país nunca antes havido em nossa história.

O governo busca, com o marco regulatório, fugir da armadilha que a máquina neoliberal teceu por cima dessa realidade e balançar o pau do circo erguido pela "era FHC" sobre as reservas petrolíferas brasileiras. A manutenção da Petrobras como estatal já é uma proeza e tanto se considerarmos a intensidade dos ataques desferidos contra a empresa nos últimos anos.


A idéia de privatizar a Petrobrás surgiu oficialmente em 1996, quando um tucano de alta plumagem — o então presidente do BNDES, Luis Carlos Mendonça de Barros — desceu do muro para colocar o guizo no pescoço do gato. Mendonção, como é conhecido, era uma voz que deveria ser levada a sério — ele foi um daqueles baluartes da tribo que ajudava a manter no exílio gente como FHC e José Serra.


De 1870, quando a indústria petrolífera mundial já movimentava milhões de dólares, até 1934, quando as riquezas do nosso subsolo foram nacionalizadas, o Brasil esteve disponível para que qualquer país — ou empresa — investisse na pesquisa de petróleo. A decisão brasileira foi uma resposta aos propósitos dos monopólios que se formaram com a história do imperialismo do século 19 e do início do século 20.


Eram tempos de partilhas de mercados, de guerras mundiais, de modificações nas correlações de forças e de soberanias nacionais ameaçadas. Na América Latina, território historicamente cobiçado pelos norte-americanos, o México nacionalizou seu petróleo em 1938 e a Argentina já explorava suas jazidas na década de 40. Chile e Bolívia encaminhavam-se para o monopólio do Estado sobre o combustível nacional. E a formação do bloco socialista tirou do campo de visão dos monopólios imperialistas importantes reservas mundiais — um dos quatro maiores lençóis de petróleo, o do Mar Cáspio, passou para as mãos dos povos soviéticos.


O drama do petróleo entrava em uma fase nova, marcada pelo avanço da democracia contra o imperialismo. Já naquela época, as concessões abarcavam regiões imensas. Uma companhia norte-americana era concessionária de toda a Abissínia — hoje Etiópia. Na Arábia Saudita, metade do país estava nas mãos de outras duas empresas dos Estados Unidos. Em 1945, o Paraguai outorgou a uma petrolífera norte-americana concessões que compreendiam dois terços do seu território.


Na Venezuela, regiões imensas foram entregues às companhias norte-americanas e inglesas. Os Estados Unidos controlavam mais de 80% do petróleo do mundo capitalista, cerca de 70% de toda a produção mundial. Em muitos países, como a Venezuela, populações miseráveis vegetavam em torno de poços riquíssimos.


A luta pelo petróleo nacional, portanto, brotou em plena batalha mundial pelas reservas petrolíferas. Era uma questão que requeria a união do povo brasileiro e um governo minimamente comprometido com a independência nacional. Apoiada na tenacidade dos pioneiros Monteiro Lobato e Oscar Cordeiro — dentre outros —, e fortalecida pelo esclarecimento da campanha "O Petróleo é Nosso" abriu caminho entre todas as barragens e emergiu como um grande movimento popular em defesa da soberania nacional.


Por ter esse papel, os entreguistas brasileiros — autênticos irmãos das sete irmãs que monopolizam a indústria petrolífera privada no mundo — nunca aceitaram de bom grado o papel da Petrobrás. Já em 1975, o governo brasileiro — na época liderado pelo ditador Ernesto Geisel — permitiu que empresas estrangeiras pesquisassem dois milhões de quilômetros quadrados de bacias sedimentares brasileiras.


Nos 14 anos em que esta concessão vigorou, nenhuma gota de petróleo foi encontrada pelas maiores petrolíferas do mundo. Enquanto isso, a Petrobrás manteve seu vertiginoso crescimento e, no mesmo período, duplicou a produção brasileira. Com a chegada de FHC ao poder, os ataques ao monopólio estatal do petróleo se intensificaram — e resultaram na aprovação da Emenda Constitucional nº 9, no dia 9 de novembro de 1995, que deu nova redação ao parágrafo primeiro do artigo 177 da Constituição Federal de 1988. Iniciava-se o processo de abertura da indústria petrolífera e gasífera no Brasil.


Até as vidraças do Palácio do Planalto sabem que a chamada Lei do Petróleo, aprovada dia 6 de agosto de 1997, confere legalidade ao entreguismo. Compreensivelmente, o governo tem dito que a legislação precisa ser cumprida. Ou seja: promover os leilões é um tiro no joelho, mas não promovê-los significaria um tiro numa região ainda pior. Não foram poucos os que discordaram desta opção. Cito aqui, por ser emblemático, o exemplo da Central Única dos Trabalhadores (CUT), que em nota pediu "a suspensão definitiva do Programa Nacional de Desestatização (PND)".


As hordas neoliberais que predominam na mídia impedem um debate sério a respeito deste assunto. Seus comentários são sempre ocos e veleidosos, e só fazem reproduzir velhos pontos-de-vista carregados de astigmatismo. O hedonismo pouco ilustrado deste tipo de "debate" impede uma visão mais global sobre o tema. Mas o surgimento, ainda que rudimentar, da campanha "O Pré-sal tem que ser nosso" é algo que merece ser acompanhado com muita atenção.


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: E o Governo Lula?
Osvaldo Bertolino -
O governo Lula chega ao fim de seu segundo mandato com imensos êxitos. Creio que o mais significativo deles é o de ter resgatado a marcha do mais recente ciclo civilizatório, iniciado com a Revolução de 1930. Quando Getúlio Vargas chegou ao Palácio do Catete num trem militar vindo do Estado do Rio Grande do Sul, o país inaugurou uma nova era.

O líder da revolução vestia um uniforme cáqui, com um revólver metido na cintura, e representava, até na forma de vestir, os tenentes rebeldes que promoveram dois levantes e uma marcha histórica — a Coluna Prestes — na década de 20 contra a República Velha. Até então, o Partido Republicano Paulista (PRP) e o Partido Republicano Mineiro (PRM) revezavam-se no poder. O país era essencialmente rural — apenas 10% do Produto Interno Bruto (PIB) era industrial.


Quando o esquife de Vargas deixou o Catete, 24 anos mais tarde — ele foi deposto por um golpe militar em 1945 e voltou à Presidência da República pelo voto popular em 1950 —, o Brasil não era nem sombra daquele país esculpido pelas oligarquias paulista e mineira. Em 1955, a produção industrial já representava 30% do PIB.


Uma das primeiras providências de Vargas foi alterar o papel do Estado. Antes, o governo interferia na economia apenas para garantir a boa vida dos oligarcas. O Estado comprava o café para preservar os fazendeiros de eventuais problemas na produção e da oscilação de preços no exterior. A moeda nacional flutuava ao sabor dos interesses dos fazendeiros — quando o preço caía no mercado internacional, o governo desvalorizava o dinheiro brasileiro e assim garantia os ganhos dos cafeicultores.


O novo presidente optou pela intervenção do Estado na economia para promover o desenvolvimento industrial. De 1932 a 1937, o PIB cresceu, em média, 7% ao ano. O Estado construiu empresas estratégicas para a economia nacional, como a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) e a Vale do Rio Doce, e criou uma vasta legislação trabalhista — a CLT — e social. No seu segundo governo, Vargas criou a Petrobras — iniciativa que resultou de um vigoroso movimento patriótico — e fundou o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE).


As turbulências políticas do primeiro governo Vargas decorreram das contradições que envolviam o país. Os levantes dos tenentes e a Coluna Prestes tinham como objetivo único derrotar as oligarquias da República Velha. Eles não formaram um partido político e deram seqüência às suas carreiras políticas por caminhos distintos.


Quando ele voltou ao governo, o país já estava enquadrado no molde da Guerra Fria e respirava os ares reacionários do governo Dutra — aliado incondicional do imperialismo norte-americano. Vargas fez um governo dúbio: ao mesmo tempo em que cedeu aos setores golpistas das Forças Armadas, porta-vozes dos interesses militares norte-americanos, com o acordo militar Brasil-Estados Unidos, amainou a repressão política.


O governo também desenvolveu uma política nacional de impulso à industrialização, enfrentou a crise econômica deixada por Dutra e procurou atrair o apoio dos trabalhadores. O ministro do Trabalho, João Goulart, propôs um reajuste de 100% no salário mínimo, sofreu um violento ataque de militares reacionários e caiu — mas Vargas bancou a proposta e concedeu o reajuste. O governo também enfrentou o imperialismo, criando uma lei de remessa de lucros para obrigar as empresas estrangeiras a investir no país.


Violentamente atacado pela direita, Vargas respondeu ao ultimato para que renunciasse dizendo que só sairia do Catete morto — como de fato aconteceu. Com a popularidade em alta, seu suicídio revoltou a população, que chorou a morte do presidente, apedrejou a embaixada dos Estados Unidos e incendiou jornais. Os comportamentos do povo e da elite naquele episódio iriam marcar a trajetória do país.


De alguma forma, até o golpe militar de 1964, depois de vários atentados contra a ordem democrática perpetrados pelos grupos reacionários, tínhamos uma unidade costurando o país. O "milagre econômico" representou uma afluência excludente — a uns foi dado o acesso aos padrões de vida de uma sociedade industrial e a outros foi dada apenas a cota de sacrifício necessária àquele salto econômico.


Encerrado o período militar, o desafio sempre foi o de operar um novo ciclo de crescimento com outras premissas — expectativa que ainda não se transformou em realidade. A primeira tentativa, nesse sentido, ocorreu quando Itamar Franco assumiu a Presidência da República em substituição a Collor de Mello.


Itamar, a rigor, sofreu um golpe branco — começaram a dizer que, já que ele foi eleito junto com Collor, deveria assumir o seu programa de governo. Essa pressão resultou no Plano Real e na nefasta "era FHC". Neste período, a mídia só fez esconder a informação, não dando a idéia do que estava acontecendo e transformando o que existe de pior para o país — a política macroeconômica neoliberal — em um mundo róseo.


Chegamos, enfim, à era Lula. "A mudança para a esquerda na América do Sul é uma reação ao fracasso, dramaticamente evidente em alguns casos, da política econômica de livre mercado imposta pelos Estados Unidos e pelas agências internacionais sob sua influência, na era do chamado Consenso de Washington. Sem esse fracasso, é quase certo que Lula não teria sido eleito", disse o historiador marxista Eric Hobsbawm em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo. Isso diz tudo.


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: A democratização da informação e a decadência da grande mídia?
Osvaldo Bertolino -
Num momento em que existe um volume inédito de informações à disposição do público, é possível que nunca o cidadão brasileiro tenha estado tão mal informado como hoje. É um paradoxo dos nossos dias. E um problema para todo mundo. Os grandes meios de comunicação têm desempenhado com competência o papel de desinformar.

Para quem tem a necessidade de decidir, basear-se em informação errada, distorcida, viciada ou simplesmente falsa significa, freqüentemente, tomar decisões equivocadas ou deixar de tomar decisões certas. A conseqüência, na vida real, é, para muitos, a perda de rumo, de oportunidades e eventualmente da própria perspectiva.


Criticar certas publicações, ou determinados jornalistas, principalmente se quem faz a crítica tem algum tipo de estatura, é receita quase certa para entrar numa lista de "inimigos". Eis outra característica marcante da mídia: ela inspira em muita gente medo em vez de admiração.


A má informação na mídia brasileira de hoje se manifesta de diversas maneiras, mas seu foco mais visível está na obsessão de apresentar um quadro de catástrofe terminal para o governo do presidente Lula. Resultado: a mídia raramente consegue ver uma nuvem sem logo anunciar uma inundação.


Nesse tipo de anúncio, os jornais têm a contribuição milionária de especialistas (os principais dirigentes dos partidos vincados ideologicamente com a marca da direita, como o PSDB e o DEM) em vaticínios funéreos. O pólo intransigente da oposição desgosta, evidentemente, da guinada decisiva para o país que representou e eleição de Lula. Pela primeira vez o Estado foi posto às ordens de todos. O gatilho da integração social foi acionado — coisa que não existia, apesar de a cidadania universal estar consagrada na lei.


Manobras dessa envergadura não encontram sustentação sob nenhum ponto de vista ético. Ocorre que esse modelo de mídia que existe no Brasil foi montado para ser uma poderosa fábrica de "crises" em situações como essa. E a fórmula é infalível: prognosticam-se o caos e, com isso, os "escândalos" conquistam as primeiras páginas.


Jornais e dirigentes políticos direitistas acabam formando uma espécie de consórcio que se auto-alimenta e se manipula mutuamente na produção e na divulgação de más notícias. A overdose de denúncias, acusações e condenações sumárias resultantes disso acaba por provocar sérias distorções na qualidade de informação que o público recebe.


Hoje, para os órgãos de comunicação, a realidade é só aquilo que aparece na mídia — o que está lá existe; o que não está não existe. Isso é claramente percebido em certas entrevistas. Responder às perguntas de determinados jornalistas vai se tornando um exercício cada vez mais parecido com uma partida de xadrez, onde é necessário antecipar os três ou quatro lances seguintes do adversário.


A pergunta não é simplesmente uma pergunta: muitas vezes é uma armadilha destinada a extrair alguma declaração que será usada contra o entrevistado nas perguntas à frente. A pessoa que está sendo inquirida precisa, assim, calcular cuidadosamente tudo o que diz. Se disser A, será perguntada adiante a respeito de B ou C; se disser Y, abrirá espaço para que lhe perguntem sobre X ou Z, e assim por diante. Entrevistas supostamente jornalísticas se transformam em interrogatórios.


O fato é que muitos jornalistas, quando se dirigem a alguém, não querem realmente obter uma informação. Querem apenas obter alguma forma de confirmação ou justificativa para aquilo que já decidiram escrever — por já terem decidido, interiormente, que sua visão pessoal das coisas equivale à realidade.


Declarações, fatos ou números que se contraponham a ela são ignorados; só é levado ao público o que combina com aquilo que esse tipo de jornalista quer dizer. As acusações, convenientemente, baseiam-se em fontes anônimas. E, quando a mídia tenta apresentar testemunhas capazes de provar alguma coisa, tudo o que aparece são obscuros personagens que não testemunham nada e dizem, no fundo, apenas ter ouvido falar da história. Mas isso não é suficiente para coibir o frêmito acusatório.


Topar tudo para conseguir um suposto "furo" tem um perverso efeito colateral: a corrosão do caráter do jornalista. Um jovem que chegue a uma redação e seja confrontado com a realidade cotidiana de trapaças de variadas espécies para a obtenção de notícias — mentiras sobre a natureza da reportagem para conseguir entrevistas e gravadores escondidos para colher flagrantes, para ficar apenas em dois exemplos — é rápida e inevitavelmente engolfado pela frouxidão dos valores.


Muitos jornalistas no fundo amam os "escândalos" que parecem odiar. É que "escândalo" move carreiras. Quem cobre "escândalos" conquista a notoriedade proporcionada pela primeira página, tem a chance de transformar essa notoriedade em promoções dentro da redação e costuma arrebatar os mais importantes prêmios do jornalismo brasileiro.


O caso Collor foi o grande deflagrador da denunciamania da mídia brasileira. Não que a gritaria não existisse antes. É que com Collor — comprovadamente um político de maus costumes — ela chegou a um paroxismo histérico que nunca mais se desprendeu do noticiário. Depois disso, vieram "escândalos" em série. Se alguns tiveram bases sólidas — principalmente os da “era FHC” —, muitos se revelaram capazes apenas de degradar a palavra "escândalo", dada sua miserável insignificância. Essa mídia, definitivamente, não tem nenhuma serventia para a democracia e para a cidadania. Ela precisa acabar o quanto antes.


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: O sucesso do Pan no Rio de Janeiro, Copa do Mundo 2014, Olimpíadas 2016, PAC, crescimento do emprego e da economia, Programas Socias, participação do Brasil em Copenhague e outras conquistas do Governo Lula terão efeito positivo na candidatura de Dilma Rousseff em 2010?
Osvaldo Bertolino -
Não tenha dúvidas. Este governo pode ser definido como bem-sucedido do ponto de vista social. É possível que a coalização de centro-esquerda ganhe mais quatro anos dos brasileiros já no primeiro turno, com uma vitória mais contundente do que a que realizou em 2002 e 2006. Lula está com um crédito imenso. Não tínhamos um presidente que aparente tamanha sobriedade diante dos problemas como Lula desde os tempos de Juscelino, Brasília e a bossa nova.

Primeiro que tudo, é preciso considerar que todas as previsões da direita de poucos meses atrás se revelaram verdadeiros fiascos. Veja o caso do senador Álvaro Dias (PSDB-PR) no auge do “mensalão”. Ele afirmou: "Faço uma roleta-russa com seis balas no revólver se o Lula sair dessa!". (Felizmente, o resultado das pesquisas parece ter lhe tirado as energias para o gesto.)


Como a vida em outros planetas, todos concordam que deve haver no campo governista uma voz contrária à candidatura de Dilma Roussef. O difícil é identificá-la. Obviamente que haverá uma pedra no caminho: o conservadorismo do Banco central (BC). Lula deveria ter tirado Henrique Meirelles da presidência da instituição há muito tempo.


Não se estou aqui pedindo a sua substituição por um santo milagreiro, capaz de fazer os juros desabar até patamares norte-americanos, a inflação se manter num padrão chileno e o produto interno bruto brasileiro crescer em ritmo chinês. Mas alguém que seja afeito ao debate, menos "ortodoxo", aberto a novas perspectivas.


Ninguém esperava que a sua gestão na Presidência fosse tranqüila como um passeio no bosque. O Brasil é um país complexo, com demandas que invariavelmente superam a capacidade de quem quer que seja de satisfazê-las. Com isso, as crises se incorporam ao dia-a-dia da nação. O que há de novo é a incrível habilidade do presidente em lidar com conflitos. Esse dote de Lula será decisivo para atrair aliados para a campanha de Dilma.


O governo vive um paradoxo, que deverá marcar a próxima administração: ele tenta promover transformações profundas no país a partir do arcabouço envelhecido e ineficiente que é o Estado brasileiro herdado da "era FHC". É neste capítulo do novo contra o velho que se insere a contradição que mais dia menos dia terá de ser solucionada. Ninguém mais imagina, de verdade, que o desenvolvimento econômico possa prescindir do Estado.


Na outra ponta da corda, as forças da reação tendem a defender a manutenção dos cenários estabelecidos de uma forma cada vez mais radical. Em conseqüência, as possibilidades de diálogo com forças políticas amplas são maiores. Dilma é o único nome com chances de comandar esse processo? Tudo indica que sim. Tente apontar uma alternativa melhor.


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: Se você fosse presidente do Brasil por um dia, que faria no lugar do Lula?
Osvaldo Bertolino -
Minha vocação é outra. Não sei dizer o que faria. Mas certamente faria algo que fosse fruto de um juízo coletivo. Aproveito a pergunta para lembrar a obra A Grande Muralha da China, na qual o escritor Franz Kafka fez uma brilhante alegoria. Aquele monumento arquitetônico teria sido erguido pedaço a pedaço, em pontos distantes um do outro, como se fossem construções distintas.

Esse plano foi escolhido não porque fizesse sentido em termos econômicos ou militares, mas porque os altos dirigentes que o conceberam sabiam que os mestres-de-obras e os pedreiros que o executavam não suportariam a idéia de um trabalho que só seria concluído após várias gerações, e cujo sentido último portanto jamais apreenderiam. Uma vez concluído um pedaço de cerca de 500 metros, esses mestres e artífices eram enviados para longe, para outras províncias, ou devolvidos às aldeias de onde provinham.


No caminho viam outros pedaços da muralha sendo erguidos, sem entender para que serviriam, nem como ou quando se ajustariam a um conjunto mais amplo. Outra vez convocados para a construção, anos depois, em lugar diferente do anterior, eram homenageados pelas autoridades locais, despediam-se de parentes e amigos e eram saudados e encorajados por milhares de pessoas que se postavam à beira das estradas por onde haveriam de passar.


Dessa forma, embora não chegassem a antever ou a compreender como seria a muralha em sua completa perfeição, pelo menos sentiam que estavam contribuindo para a futura proteção desses milhares de afetuosos compatriotas, que lhes seriam eternamente gratos por seu trabalho.


O problema que hoje vivemos no Brasil não é tão distinto desse a que se refere Kafka. Muitos brasileiros sabem que não concluiremos a muralha de que necessitamos contra o atraso e a degradação social se não enfrentarmos um longo período de políticas econômicas e sociais realistas. Sem destravarmos em definitivo o desenvolvimento do país, podemos discutir e nos acusar uns aos outros à vontade — mas não iremos a lugar nenhum.


Não se chega ao longo prazo sem passar pelo curto. Como alguém já disse, o desenvolvimento cria problemas que só mais desenvolvimento pode resolver. A questão é que alguns dos problemas criados (ou não resolvidos) pelo desenvolvimento se agravaram e certas lideranças progressistas passaram a descrer, talvez até inconscientemente, da idéia de desenvolvimento.


Na China de Kafka, a volta ao particular e ao curto prazo era uma maneira de reencontrar o sentido do fazer coletivo. No Brasil de hoje, o curto prazo é que não faz sentido: sem o grande projeto imaginário, ele facilmente se transforma num jogo de cabra-cega (um desconjuntado enfrentamento de interesses corporativos, de partidos ou de facções) ou se desfaz em debates que mais parecem rituais preparatórios para algum combate.


Essa discussão histórica ainda permeia a luta política no Brasil. Felizmente, não passamos pelas conversões em massa de socialistas ao liberalismo, como ocorreu na Europa — algo que reproduziu em cada país o drama bíblico da conversão de Saulo na estrada de Damasco. Debaixo dos gritos dos liberais, as forças progressistas vão saindo de um longo período de defensiva.


Esse fenômeno só é possível porque os fatores políticos e sociais se somaram aos dados da ordem econômica vigente. Os esforços para entender essa nova realidade avançam para um sentido estratégico. As forças desenvolvimentistas estão reconquistando e desenvolvendo, pela luta, os fundamentos do seu programa. A perspectiva progressista conquista espaços práticos e teóricos mas só um desenvolvimento real das lutas sociais dará forma política a essa nova realidade. O processo é simples. E urgente.


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: Deixe uma mensagem para o leitores do Blog da Dilma.
Osvaldo Bertolino -
Este espaço é precioso. Penso que a blogosfera deve ser mais valorizada. A Internet deve ser ocupada pelos democratas e progressistas. Pode ser impressão, mas vejo uma apatia das forças progressistas na atual fase da disputa ideológica que se trava na Internet brasileira. Poucos leitores comentam o que se diz em blogs e sites de esquerda. O pensamento direitista, reacionário e preconceituoso, ao que parece, nada de braçadas. Por que isto acontece? Creio que é preciso parar para pensar.
As relações entre o governo Lula e a mídia estão em seu pior momento. Blogs, colunas, editoriais e peças pretensamente humoristas propagam pela Internet uma onda conservadora que chama a atenção e faz pensar. Está claro que os pontos de vista, as análises e o noticiário de diversos órgãos de imprensa que não pertencem ao monopólio midiático brasileiro compõem um quadro muito ruim para a direita.

O Brasil conhece bem, e há muitos anos, a situação de ter dentro de si diversos países diferentes convivendo ao mesmo tempo. No presente momento, a diferença que mais chama a atenção é a existente entre o Brasil da calamidade e o Brasil do progresso. O primeiro, como dizem os mestres-de-cerimônia ao introduzir algum personagem que todo mundo conhece, dispensa apresentações: é o Brasil da elite em particular e da mídia, visível todo dia e a qualquer hora num noticiário político que cada vez mais se parece com os programas de palhaçadas.

O segundo Brasil é o país do trabalho, do mérito e do progresso — tão real, tão visível e tão vigoroso em suas virtudes quanto o primeiro é vigoroso em seus vícios. A questão mais relevante do momento, do ponto de vista prático, é determinar até onde o país da mídia pode piorar — e os fatos mostram que ele tem tudo para continuar piorando — sem que isso torne inviável o país do avanço. É muito fácil, diante da degeneração crescente da mídia, concluir que o filme já terminou e o bandido acabou ganhando.

Mais difícil, porque dá mais trabalho, é separar as emoções das realidades — e quando se faz essa tarefa com aplicação e cabeça fria o que começa a tomar forma é a possibilidade de que esteja ocorrendo exatamente o contrário. Sem dúvida, o Brasil arcaico dá provas diárias de que está mais vivo e atuante do que nunca. Mas, ao mesmo tempo, parece cada vez menos capaz de impedir os avanços do Brasil novo. Qual o caminho a seguir? Os fatos, mais que as propagandas ou os desejos, vão responder de um jeito ou de outro a essa pergunta.

É uma lástima que a direita no Brasil esteja mais preocupada em preservar a estrutura medieval de nossa sociedade do que em debater abertamente a situação do país. A esquerda não pode se encolher diante disso. Na Internet, predomina o ideário elitista. Precisamos de mais blogs, colunas e opiniões progressistas como este. É o futuro da nação que está em jogo. E ele pode começar a ser definido neste terreno da luta de idéias. Portanto, blogueiros e colunistas progressistas: uni-vos! Acesse o blog:

O OUTRO LADO DA NOTÍCIA:

http://www.vermelho.org.br/blogs/outroladodanoticia/

Comentários

Adir disse…
Espero ainda ver as empresas não precisar publicar seus balanços em papel, oras, por quer não publicar só no site da empresa?! estará lá para quem quiser consultar!