Escrito por Flávio Aguiar - AgênciaCartaMaior
Durante ato de fundação do novo partido de esquerda na Alemanha, o PT sequer foi lembrado como um partido deste campo. Referências foram o MST, Hugo Chávez e Evo Morales. Labutam em erro nossos novos companheiros.Li o relatório feito por Ricardo Azevedo, da Fundação Perseu Abramo, sobre a fundação do novo partido de esquerda na Alemanha, Die Linke, cerimônia para onde foi enviado como representante do Partido dos Trabalhadores. Diz o relatório que o PT sequer foi lembrado no ato como um partido de esquerda, mas que as referências nesse campo eram ocupadas pelo MST, e os presidentes Hugo Chavez e Evo Morales.

Labutam em erro nossos novos companheiros. Aliás nem tão novos, pois o Linke é resultado da fusão de dois partidos de esquerda, um o remanescente da antiga Alemanha Oriental e o outro uma dissidência do Partido Social Democrata, atualmente em coligação com a conservadora União Democrata Cristã, da primeira ministra Ângela Merkel. Vá lá: para os corações mais estremecidos o PT e o governo Lula deixaram de ser “de” esquerda, “se é que foram um dia”, conforme a frase da moda que mais se ouve neste nicho do pensamento contestador. Assim mesmo, é impossível deixar de considerar que, não só o PT abriga algumas facções decididamente “de” esquerda (não vou nomear para não ferir sentimentos – dos que ficarem de fora), mas que continua a ser um partido “à” esquerda, no espectro global do pensamento nacional – e internacional. O mesmo se pode dizer do governo Lula.

As relações internacionais desempenham papel não secundário nisso. Quem é visto como “representante” do terceiro mundo, amplamente globo a fora, é Lula, não é Chavez, nem Morales. E Chavez e Morales só têm o espaço que têm na América do Sul por causa do Brasil de Lula, doa a quem doer esta constatação. A política externa brasileira ganhou pontos com o impasse de Potsdam, quando EUA, União Européia, Brasil e Índia não chegaram a um acordo sobre a troca de diminuição dos subsídios agrícolas por liberação de tarifas sobre produtos industrializados. Em outros tempos a diplomacia brasileira poderia estar catando migalhas sobre e embaixo da mesa. Como disse o primeiro ministro indiano depois, os Estados Unidos não perceberam que algo mudou, e não nos números, sublinhou ele, mas nas atitudes.

Nem Rússia, certamente, muito menos China, nem Cuba, muito menos Venezuela (o caso da Coréia do Norte é mais complicado) podem representar o papel da diplomacia brasileira no lento (é verdade), mas seguro (como tudo nessa nossa terra) propor (o que já é avançar) uma nova ordem comercial para o mundo. E que leve em conta as necessidades ambientais de preservação do planeta, como é o caso agora, em conjunto com o necessário desenvolvimento dos países empobrecidos por centenas de anos de dominações coloniais, imperialistas e oligárquicas. A China se parece cada vez mais com os Estados Unidos de amanhã. A Rússia está comprimida, pelo menos por ora, pela nova política de Guerra Fria do governo Bush, além de envolta em seus próprios problemas autoritários. Cuba tem carisma e liderança ideológica, mas por ora é só, embora este só seja muito. A Venezuela, sem o Brasil, fica isolada no plano mundial, e depende demais de seus petrodólares para ser por ora uma alternativa energética. O México está sob um governo de direita e resultante de uma eleição contestada. A África do Sul e a Argentina ainda administram situações internas frágeis do ponto de vista econômico. O governo indiano é conservador, ainda que não reacionário como o anterior.

Assim, os companheiros novos (e bem vindos) alemães que me desculpem, mas o que resta é o Brasil do governo de Lula. E (ainda que compartilhado) do PT. No próximo artigo, abordarei o plano nacional. Flávio Aguiar é editor-chefe da Carta Maior.

Dez anos depois, a volta das Spice Girls (Melanie Chisholm, Emma Bunton,
Melanie Brown, Victoria Beckham e Geri Halliwell) fotografadas em Cannes em maio de 1997.

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